Carregando: Narrativas Ambientais Rio Grande do Sul
Em maio de 2024, o Rio Grande do Sul enfrentou uma grave crise climática, com mais de 400 municípios afetados por chuvas intensas e inundações.
A rápida elevação do nível do lago Guaíba agravou a situação, resultando em um estado de calamidade com desalojamento de famílias, interrupção de serviços essenciais e impacto significativo no comércio local.
Nesse cenário, as redes sociais desempenharam um papel fundamental na disseminação de informações e na mobilização social, impulsionando arrecadações de recursos por meio de vaquinhas, rifas, ONGs e influenciadores digitais.
As plataformas digitais se tornaram espaços centrais para a construção de narrativas durante a crise, refletindo uma conversação polifônica e dinâmica. A participação ativa dos usuários evidenciou como o meio digital potencializa a organização coletiva, seja para campanhas de ajuda humanitária ou para o compartilhamento de atualizações em tempo real.
Em contextos emergenciais, essas redes se tornam ambientes estruturantes da comunicação, moldando discursos e relações entre diferentes atores sociais.
Nesse contexto, compreender as interações dentro dessas redes exige métodos que capturem a complexidade do discurso digital. A análise de redes sociais, aliada à visualização gráfica, possibilita um olhar mais estruturado sobre a difusão de informações e a formação de comunidades discursivas.
Este estudo explora tais dinâmicas, analisando a estrutura das conversações online sobre as enchentes no Rio Grande do Sul a partir de dados extraídos do X (antigo Twitter), com foco nas relações entre atores, discursos e fluxos informacionais.
Metodologia e Corpus
O corpus deste estudo foi composto por dados coletados pelo Laboratório de Internet e Ciência de Dados (LABIC/UFES). A coleta ocorreu diariamente entre 6 e 31 de maio de 2024, utilizando duas queries com os termos "Rio Grande do Sul" e "RS".
Após a extração, os dados passaram por um processo de limpeza e organização para a eliminação de duplicatas e estruturação em um único arquivo, por meio do software Ford/Labic. Para esta análise, restringimos o corpus ao termo "Rio Grande do Sul".
O conjunto final de dados compreendeu 44.236 mil postagens,4.428.770 retweets,1.498.417 comentários, 25.832.215 curtidas totalizando 31.759.402 interações no período analisado.
Com o dataset consolidado, realizamos o processamento dos dados utilizando o software Ford/Labic para a construção de uma rede de palavras. Essa rede, denominadawordgraph, reflete a organização lexical das postagens coletadas, destacando as 150 palavras mais frequentes e suas 15 associações mais recorrentes.
Essa estrutura permite visualizar padrões linguísticos e compreender a dinâmica da conversação predominante durante o período.
A modelagem dos grafos foi fundamentada em duas métricas estatísticas essenciais: modularidade e grau ponderado.
🔹 Modularidade: possibilita a identificação de comunidades dentro da rede, destacando agrupamentos com alta densidade de conexões internas e menor interação com outros grupos. Essa métrica facilita a segmentação e a visualização dos clusters, reforçada pelo uso de uma paleta de cores para diferenciar as comunidades.
🔹 Grau Ponderado: quantifica a força das conexões entre os nós, considerando não apenas a existência das ligações, mas também sua intensidade.
Na visualização, essa métrica foi representada pelo espessamento das arestas entre os termos, evidenciando a força das relações e permitindo uma análise mais precisa das interações dentro da rede.
O grafo representa a rede wordgraph, estruturada a partir da organização lexical de todos os posts coletados no período. Foram identificados sete clusters distintos, representados por uma paleta de cores que reflete a modularidade da rede.
O nó central "rio" concentra o maior número de menções (45.191 vezes), enquanto os clusters periféricos estruturam diferentes narrativas associadas ao evento.
Narrativas predominantes nos clusters
🔴 Cluster Vermelho (Ajuda e Solidariedade): Centraliza postagens sobre mobilização social diante da crise das enchentes, com termos como "doações", "ajudar" e "solidariedade". O engajamento online foi marcante, reforçado por influenciadores digitais.
🟠 Cluster Laranja (Narrativa Política - Governo Federal): Apresenta o termo "lula" como nó denso, associado a "projeto", "trabalhando" e "reconstruir". O discurso enfatiza a reconstrução do estado pelo governo federal, com menções a Dilma Rousseff e ao Banco dos BRICS.
🟡 Cluster Amarelo (Territorialidade e Informação Pública): Destaca a menção a localidades como Porto Alegre e Canoas, além de termos como "alerta" e "moradores". O foco é a comunicação visual e a atualização sobre áreas de risco.
🟢 Cluster Verde Claro (Calamidade e Segurança Pública): Reúne postagens sobre medidas de proteção e atuação da Defesa Civil, com termos como "defesas", "abrigos" e "calma". As postagens reforçam a importância da informação oficial para evitar tragédias.
🟢 Cluster Verde Escuro (Narrativa Política - Governadores e Oposição): Inclui os nomes de Jair Bolsonaro, Eduardo Leite e Paulo Pimenta, refletindo debates políticos sobre a resposta das lideranças estaduais e federais à crise.
🔵 Cluster Azul Claro (Dissonâncias e Conflitos Narrativos): Agrupa discussões sobre desinformação e teorias conspiratórias, com termos como "fake news", "exército" e "globo". Apresenta críticas à mídia e debates sobre a presença das Forças Armadas na tragédia.
🔵 Cluster Azul Escuro (Histórico e Comparações com 1941): Concentra postagens comparando as enchentes de 2024 com as de 1941, quando o Lago Guaíba atingiu 4,76 metros. Enfatiza a crise atual como um fenômeno climático sem precedentes.